sábado, novembro 18, 2006

Perseguição

Há uma pantera me esperando de tocaia:
Algum dia vou morrer graças a ela;
Sua gana ateou fogo nas florestas,
Ela espreita, envolvente como a lua.
Muito macio e suave desliza seu passo,
Avançando sempre pelas minhas costas;
Da cicuta soturna, gralhas gritam desastre:
A caçada começa, o cerco está armado.
Esfolado por espinhos eu percorro pedras,
Ressecado pelo calor branco do meio-dia.
Ao longo da rede vermelha de suas veias
Que fogos correm, que desejos despertam?

Insaciável, ela explora e pilha o território
Condenado pela falha de nossos ancestrais,
Gritando: sangue, que o sangue jorre mais;
Carne tem que encher na sua boca o rasgo novo.
Afiados os dentes dilacerantes e doce
A chamuscada fúria de sua pelugem;
Seus beijos deixam crestas, as patas, fuligem,
Só um juízo final consumirá sua fome.
No rastro da grande felina encarniçada,
Acesos como tochas para sua diversão,
Homens tostados e devorados no chão
Viram iscas de sua fúria esfomeada.

Morros já tramam perigo, a sombra se incuba;
A meia-noite encobre o bosque opressor;
A saqueadora negra, atrelada pelo amor
Nos quadris fluentes, me força à fuga.
Por trás do matagal confuso dos meus olhos
Fléxil ela espera; na emboscada dos sonhos,
Brilhantes as garras que estraçalham corpos
E famintas, famintas, suas tensas coxas.
Seu ardor me enlaça, incendeia as árvores,
E eu fujo com minha pele já flamejante;
Qual acalanto, qual alívio será frio bastante
Quando esse olhar de topázio queima e marca?

Lanço-lhe meu coração para frear seu ritmo,
Desperdiço sangue para saciar sua sede;
Ela come, mas não alivia sua ansiedade,
Que requer compulsiva um total sacrifício.
Sua voz me alicia, me enfeitiça em transe,
A floresta estripada desmorona em cinzas;
Apavorado por desejo secreto, fujo ainda
De um ataque tão violento e rutilante.
Entrando na torre dos medos mais sentidos,
Fecho as portas da minha culpa sinistra,
Eu tranco a porta, tranco toda e cada porta.
O sangue acelera, retumba nos ouvidos:

Os passos da pantera vêm pelas escadas,
Subindo mais, subindo mais pelas escadas.


Sylvia Plath

E de quem mais poderia ser?

Versão brasileira: Ivan Justen Santana


A versão em inglês (que eu gosto muito mais) pode ser encontrada aqui:
Pursuit

3 Comments:

Blogger Mocho_ao_Luar said...

conheço a autora e vejo que és fã.
para falar a verdade, nunca li por inteiro um livro dela, mas tem mesmo um estilo único...

o único livro que conheço é mesmo a campanula de vidro...já leste?!

bjinhos!:D

9:56 PM  
Anonymous Anônimo said...

Eu conheço a autora , mas penso que li so um livro dela.
Mas adorei essa "Perseguição".

E a musica no nosso blog é realmente o tony Bennett com a K.D. Lang :))

Bj **

1:05 PM  
Blogger ma said...

sim mocho. fã msm pq descobri seu texto e seus poemas como se tivesse descoberto uma amiga q não pude conhecer, cujas palavras eram exatamente o q fervilhavam dentro de mim mas q nunca fui capaz de descrever... conheço quase todos os livros dela embora ainda não tenha lido todos eles, mas isso é uma questão de tempo...
bjinhos pra ti tb!

olá sem comentários! muito bom te ver de volta por aqui! adorei a música no seu blog, tony bennet me traz boas lembranças de dias de domingo em família!!! o interessante desse poema (além do poema em si) é o fato dela o ter escrito p/ ted hughes (a pantera da poesia) antes deles se casarem...
bjos pra ti!

8:35 PM  

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