sábado, setembro 23, 2006

"Porque a gente não aprende... A gente se acostuma..." II

"Os seis meses não passaram só para ela, mas para ele também. E assim como nela, o tempo deixou marcas nele, ele também sofreu mudanças pequenas, sutis e tão decisivas quanto as dela. Passou rápido também, acumulou-se nas conversas de bares, nas noites, algumas tranqüilas, outras mal dormidas, nos dias de trabalho, (...), mais noites mal dormidas, na rotina, no dia-a-dia.
Ele sentia falta da subjetividade presente nos detalhes relativos a ela. Mas era saudade que dava e ia embora rápido, porque ele não alimentava. Mas era saudade doída, de possibilidades, do que poderia ter sido se... Mas calou-se. Manteve silêncio porque não sabia o que dizer, porque queria lhe dar espaço, porque queria lhe dar o direito de ir mais a fundo, falando o que quisesse, ou deixar como estava. Só que ocorreu o que ele não podia supor: ela calou-se e permaneceu calada. Na verdade, ele deveria supor porque vindo dela, silêncio nunca era demais. Mas não sabia o porquê de tal silêncio, então não ousou dar outro passo. E foi quando ele viu que ela foi se afastando, cada vez mais, até não mais se falarem, até ele não saber mais nada acerca dela. Silêncio completo. Fez falta, as palavras escassas, os comentários, os encontros mais escassos, o olhar, que ficava marcado na memória, na pele... Mas passou, ele esqueceu aos poucos, ela havia se transformado em uma lembrança, intocável... Ele aprendeu assim, como a esquecer dela, esquecer daquelas sensações que o convívio com ela traziam. Mas aprendeu também a calar-se e observar apenas, quando todos falavam. Foi-se seis meses e às vezes algo pequeno, um gesto, uma palavra, uma imagem o faziam lembrar dela, mas isso também era raro, e na maior parte do tempo, passado e presente, ela permaneceu lembrança escondida na gaveta mais funda, para não doer demais..."
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