quinta-feira, outubro 19, 2006

Vinte e dois...

"E cumpre-se mais uma maldição, mais uma profecia jamais dita, mas sempre presente, à espreita, esperando... Esperando o momento do seu surgimento, para brotar da terra seca e escorrer da escuridão invisível... Escorrendo como sangue seco, como suor latejante, como lágrima impura, pulsando como um coração pútrido... Pútrido e profético, pulsando como uma morte anunciada... Calada...
Anoitece mais um dia e mais uma vida, em mais uma vida. Anoitece e chove... Mas é chuva de vida, de vida que chove... Chove sonhos e eles se perdem... Se perdem na terra seca, infértil, se perdem na vida que chove, que chove porque não chora, porque é vida seca, e seca tudo ao seu redor, até a chuva, até os sonhos... Sonhos secos em uma vida infértil...
De longe escuta-se um grito abafado, grito inaudível, pois não passa de um sussurro... Um pedido... Não um qualquer, um desses de ajuda, de salvação... Pede-se a perdição... Deixar-se perder em si... Sem a pretensão de se achar assim... Perder-se e deixar-se assim... Perdido... Um pedido perdido... No meio do começo, no meio do fim, no meio do meio, do meio do todo, do meio do nada... Um grito, tão longínquo que escuta-se vindo de dentro... E de dentro, findo...
Ressoam no infinito luzes insípidas, chorosas, mudas... E daqui nada se vê... Nada se ouve... Sente-se, mas não vem do infinito... Sente-se o que nasce e morre aqui, nesse espaço fechado, aberto para o abismo, abismo do tempo, o presente passado, o passado futuro e o futuro presente... Abismo de uma única mente... Atemporal... Pesadamente finita no intervalo de uma vida... Advinda da morte... Da morte que pulsa e lateja, que chora e escorre como chuva sonhada no anoitecer da terra... Da terra que grita e se perde, que ouve e vê como luz impura no pedido da vida... Da vida que espera e brota, que abafa-se e sussurra, como sangue infinito na escuridão de dentro... E de dentro, finda..."
Em 07 de novembro de 2005.

4 Comments:

Blogger Apple said...

Transmite-me uma angústia grande este texto. De alguém a girar sobre si mesmo, a explodir por dentro, a rebentar literalmente,a soçobrar...numa espiral de contradições, num crescendo de angústia...
Pode não ser nada disso, mas foi o que me fez sentir...chega a sufocar...

Bjs :-)

12:42 PM  
Blogger ma said...

exatamente apple, nem mais nem menos... só não consegui sintetizar isso da forma como vc acabou de fazer...
bjos pra ti!

7:14 PM  
Blogger Mocho_ao_Luar said...

adorei as tuas palavras. sinto.me assim especialmente em dias de aniversário..."22" é a tua idade?! lol pode parecer estupido...mas foi o que me veio à cabeça!

7:39 PM  
Blogger ma said...

é um dos meus textos favoritos, embora não lembre o q me fez escrevê-lo...
ah, e 22 é a idade da loucura!
;)

8:03 PM  

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