sexta-feira, dezembro 29, 2006

Um feliz 2007 para todos!!!!

Esperança

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...


Mário Quintana

quinta-feira, dezembro 28, 2006

Simbologia

Pois que ontem estava pensando em várias coisas à noite devido ao clima de final de ano quando me veio a mente o significado desses símbolos... Ressurreição, vida, sorte, ciclos, renascimento...

(...)
Ninguém sabe com certeza a origem da cruz. Entretanto, parece que sua forma mais antiga, a cruz em movimento - (swástica hallada), foi encontrada na Índia. Seu significado é "boa sorte".
A cruz é considerada um símbolo universal. (...)
Pode-se encontrar cruzes em culturas tão distintas como a fenícia, a persa, a etrusca, a grega, a escandinava, a celta, a africana, a australiana, a chinesa, a tibetana, a asteca, a maia, a inca, entre outras. Mesmo que a cruz tenha um traçado muito simples está, na realidade, carregado de densa complexidade. (...) Seu significado flutua em três níveis: místico, filosófico e sociológico.
Pitágoras dizia que Deus falava através de números e, a essa linguagem, o filósofo grego chamou de matemática sagrada, ou ciência dos princípios. Ao símbolo da cruz, relacionou o número 4 que representa a ordem do mundo, as quatro bases que formam o equilíbrio da criação. (...) Mesmo assim, o número 4 tem sua origem no 2 e, por isso, a cruz também se identificou com os pares opostos de conceitos: humano-divino, espaço-tempo, liberdade-disciplina, eros-thanatos etc., duas forças em permanente conflito e complementaridade.
Também é associado à cruz o significado de centro para onde tudo converge, a Árvore da vida. [...]


Cruz de Ansata: Era um símbolo de vida, provavelmente também de vida eterna. O círculo superior representaria a mulher e a reta o homem. O círculo também poderia sugerir a divindade, a fonte de energia universal que com seu alento dota de vida e movimento ao que é terreno, simbolizado pela linha horizontal. Pode significar ainda o sol, o céu e a terra, círculo, braço vertical e horizontal respectivamente; ou do ponto de vista do indivíduo, a razão, os braços e o corpo. Também era chamada "Chave do Nilo". Os egípcios a chamaram ankh e era considerada uma chave mágica que abria a fronteira para a imortalidade.
Antigo símbolo egípcio que representa a vida, o conhecimento cósmico e o intercurso sexual. Também é conhecido por bruxos como a "Cruz Ansata", utilizado em rituais de encantamento, fertilidade e divinação. Todo faraó ao morrer levava a cruz junto às narinas para adquirir imortalidade. Ele era encontrado sempre nos hieróglifos, sendo segurado pelas divindades egípcias como se fosse uma chave, o que nos remete ao seu significado como "a chave dos portões que separam a vida e a morte", já que estes desenhos eram muito comuns em pirâmides mortuárias dos faraós. O Ankh simboliza a vida, o conhecimento cósmico, o intercurso sexual e o renascimento.

Cruz Cristã: É a mais comum de todas as cruzes. Ela era um instrumento de condenação à morte nos tempos de Jesus. Ela nos lembra o supremo sacrifício que Jesus ofereceu pelos pecados de todo mundo. Tradicionalmente ela simboliza a crucificação, no entanto, como é totalmente vazia, também nos lembra a ressurreição e a esperança da vida eterna.

Cruz Gamada (Suástica): Algumas notas sobre a história da Esvástica: Em inglês como em alemão, a palavra "esvástica" deriva do sâscrito: svatikah e significa boa sorte, afortunado. A primeira parte da palavra SVASTI pode ser dividida em duas partes: SU = (bom, bem), e ASTI = (é). A parte ASTIKAH somente, quer dizer SER. Na Índia, esta palavra é associada a coisas favoráveis - porque significa "favorável". Lá, o giro das esvásticas em sentido horário ou anti-horário tem diferentes significados. (...) Uma das mais antigas esváticas conhecidas foi encontrada em um cova paleolítica há cerca de 10 mil anos. Há cerca de 2 mil anos (...) os chineses também tomaram emprestado a esvástica e seu favorável significado. (...) O símbolo da esvástica tem sido usado por milhares de anos, praticamente por todos os grupos de seres humanos do planeta. As tribos germânicas o conheciam como a "Cruz de Thor" (...). Algo ainda mais interessante é que o símbolo foi encontrado em templos judeus da Palestina, construídos há mais de 2 mil anos. (...) Nas Américas, a esvástica foi usada pelos americanos nativos do Norte, Centro e Sul América. (...) Fonte: http://www.falundafa.org
Um dos mais importantes símbolos de toda a humanidade. Ela representa a energia criativa do cosmos em movimento. Por isso ela pode ter dois sentidos: Destrógiro (braços movimentando-se para a direita) Sinistrógiro (braços movimentando-se para a esquerda). A Destrógira representa o movimento evolutivo do Universo (positivo) e a Sinistrógira, o movimento de involução do mesmo (negativo).

Cruz Celta: A cruz celta tem origem pagã e é o símbolo das posições cardeais, das quatro estações e dos quatro elementos da natureza (terra, fogo, água e ar). O círculo representa a continuidade e a renovação dos ciclos da natureza. Por representar os elementos da natureza se tornou um talismã para dar força para conquistas.
Associada à coragem e ao heroísmo, a cruz celta ajuda a superar obstáculos e a conquistar vitórias graças aos próprios esforços. Atrai reconhecimento, fama e riqueza, mas essas bênçãos só são garantidas para quem trabalha com afinco e dedicação. Por isso, a cruz celta também concede força de vontade e disposição. A divindade relacionada a esse talismã é Lug, o Senhor da Criação na mitologia celta.


Textos encontrados: aqui, aqui e aqui.

terça-feira, dezembro 26, 2006

Do que ainda resta em mim...

Chega mais


Meu amor,

Preciso te dizer uma grande verdade: sobra, com o tempo, cada vez menos de nós em mim. Não não. Eu ainda consigo sentir teus cheiros se fechar os olhos e pensar com força. Outro dia mesmo te vi ao meu lado dormindo e ouvi teu suspiro frágil ao se remexer na cama, como sempre fizeste, sem nem ao menos estares ali, como coisa viva e real. Mas de vivo e real só havia eu. Eu que agora me reviro com sonhos outros onde tu já não moras. Visitas, mas com menos frequência.

O verão aqui já superaquecendo Porto Alegre, avermelhando as cicatrizes aquelas que tu conheces bem, e as recordações de ti meio tépidas, amornando à temperatura do corpo, enquanto arde todo o resto. Se querias saber de mim, estou bem. Pensando cada vez menos em ti.

Largar da memória de quem se amou (eu já não uso mais o presente, percebeste?) é uma prisão privilegiada dos que se entregaram até o fim. A gente se prende àquele sofrer porque é uma forma de perpetuar o relacionamento. Assim eu fiz contigo estes três anos desde a nossa separação, me grudei ao que eu sentia por ti por não saber viver diferente, por achar que nunca mais poderia ser bom, que já não havia mais a possibilidade de ver o mundo em câmera lenta ao me apaixonar. E se há alguém, Deus ou que nome tenha, que comanda de longe a vida da gente, espero que Ele esteja só esperando para apertar a tecla slow motion de novo.

Pois hoje, sem nem mesmo saberes, eu oficialmente dou um belíssimo pé-na-bunda do que resta de ti em mim.

Vá com Deus.


Escrito por Calexico



Faz um pouco menos que 3 anos, ainda penso um pouco mais do que eu queria e ainda não consegui dar o 'pé-na-bunda' do que resta dele em mim, mas falta muito pouco...

P.S.: Se já não bastasse ele ter escrito tudo o que eu gostaria de ter dito, a música deles também é a minha, mas só minha...

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Da série "favoritos"

Andares

''... Não foi um milagre , não é outra pessoa , é ela com seus ardores nojentos e é seu coração que levanta esse pesado tosco que é seu corpo. '' Hilda Hilst

Hoje eu ouvi a história de um rapaz que se jogou da janela do oitavo andar de um prédio na minha rua. Aqui pertinho, ali na outra quadra. Ali, ali, onde passeam com boxers e cockers, onde estacionam entregadores de baurú e fofocam as vizinhas sobre a vida alheia. No meio desse viver simplinho do centro de Porto Alegre, jogou-se da janela do oitavo andar um rapaz de vinte e cinco anos. Ninguém sabe dizer porquê. Nem a razão do suicídio nem porque ele escolheu jogar-se da janela ao invés de outro método menos ou mais simbólico. Jogou-se da janela.

Quando eu morava em Florianópolis, meu vizinho de corredor tomou uma cartela de calmantes com amoníaco, confortavelmente fornecidos pela tele-entrega da farmácia mais próxima. Depois de descoberto caído no chão pela namorada, ele durou mais 2 horas, me disseram. Também me contaram que fora por causa da namorada, não por ela em si, mas por ter terminado o relacionamento.

Ainda em Floripa, há 2 anos, uma menina linda, com quem sentei por umas horas tomando café no calçadão, recém chegada de Londres, num dia de loucura, impulsionada pelo colchão, jogou-se de cabeça do primeiro andar, depois de soltar-se do pai desesperado. Ela não queria morrer. Nem bem sabia o que queria, para dizer a verdade.

No dia 29 de outubro de 1983, Ana Cristina Cesar, talentosa poeta, escritora, tradutora, amiga próxima de Caio Fernando abreu, jogou-se da janela do sétimo andar do edifício onde moravam seus pais em Copacabana. Num momento de angústia urgente, como em seus poemas, aquelas eternas despedidas com gosto de gengibre e "um filete de sangue na gengiva", Ana C. não aguentou mais.

Nem tentem me explicar. Eu não pretendo entender. Não quero saber de esquizofrenia, depressão, distúrbios psicóticos, desamor, desatino, desespero, desapego. Hoje eu não vou rezar pelas crianças na África, pelas do Brasil, para o natal ser bonito, só hoje eu não vou desejar que os americanos e brasileiros aprendam a votar, nem vou pedir emprego, dinheiro, amor. Eu vou é pedir a Deus que, na arquitetura divina das vidas nossas, não dê a ninguém a ilusão de ter asas nem lhes permita viver sem esperança.

Do sétimo, do oitavo ou primeiro, a goles ásperos de amoníco, não importa, eu não consigo entender. Não mesmo. E o meu não entender não é porque eu seja pollyana a ponto de achar que viver é lindo, não mesmo. Acho inclusive que viver é doer sem remédio, não há overdose de calmantes que amenize. E para nós, não há escolha. Vivemos. E se nos tentam cortar a vida, se nos assaltam, sequestram, espancam, maltratam, se adoecemos, cerramos o maxilar, buscando garra e vida lá bem dentro, para que não nos falte nem nos tirem. Mesmo sem dinheiro, sem amor, sem pai, sem mãe, sem música, sem filho, sem teto, sem nada. Nem do sétimo, nem do oitavo ou primeiro, não é deste andar que a gente deve se jogar. A gente precisa é se jogar pra frente. E, pelo menos, andar.


escrito por Calexico


É isso... Sem mais uma vírgula sequer...
Somente o desejo de continuar andando apesar dos passos trôpegos... Sempre...

quarta-feira, dezembro 20, 2006

Do que fica e do que está por vir...

A vida que fica - uma mensagem de final de ano

Não se engane, meu amor, não se engane. A vida não passa. A vida fica, cada vez mais. Sabe aquele sorriso de ontem, o menino chorando agarrado ao pai, a bomba de creme da padaria, a vez que mandaste o chefe à merda, o gemido de prazer, o gol perfeito, o sol sobre o mar e o vento com maresia, o anel perdido, a tarde de férias, o amigo morto, o cheiro do cabelo da primeira namorada, a irritação com o taxista, a cerveja gelada entre os amigos que não mais se encontraram, o dia do casamento, a palavra mais dura de todas, o porre de Ano Novo, o cigarro na janela sobre os telhados, o abraço no saguão do aeroporto, o bolo de Fubá da avó, o livro roubado da biblioteca, a gripe mal curada, a manhã de domingo, o café com pão quentinho, o assalto à mão armada, a nuvem em formato de cachorro, aquele poema inacabado, a covardia de não ter tentado? Fica. Tudo isso e todo o resto fica. Fica nos olhos, nas mãos, nas rugas nos cantos da boca, nos cabelos que aos poucos ganham as cores do tempo e dos invernos, nas pernas mais fracas, mais bambas, mais trôpegas e cada vez mais cansadas de levantar depois de cada tombo. A vida fica cada vez mais nos pulmões e no peito, com rastros de gritos e gargalhadas, soluços, rancores, tristezas, nas costas fica a vida como cicatriz das asas arrancadas, dos punhais, no encurvar dos ombros que suportam a carga dos anos e das culpas, fica a vida, cada vez mais a vida, que nunca passa. Fica nos planos dentro da gaveta, trancados e cheirando a mofo, fica na boca com gosto de comida e riso, de beijos, das palavras que não queríamos ter dito, das palavras que não deveríamos ter deixado de dizer. Não se engane, meu amor, não se engane. A vida não passa, não. A vida fica, cada vez mais, sempre e sempre mais. Fica encrustrada na pele que ganha marcas, que perde a cor, que fica opaca. Fica nas artérias, nos lábios que enrugam dos carinhos e dos assovios, das músicas e orações desaprendidas, nos ouvidos que vão ensurdecendo de desouvir. Fica nos pés tortos e calejados do andar incessante do mundo, no ventre que vai secando de desistências e recomeços, nos olhares cegos de desatenção e desmemória, nos braços enfraquecidos pela solidão construída palmo a palmo ao nosso redor, nas frustrações e nas canalhices, nas pequenas maldades debaixo das unhas, nas desconfianças mesquinhas atrás das orelhas, no amargo da língua cheia de ressentimentos. A vida não passa, meu amor, não se engane. A vida não passa, não. Nada disso vai passar. O tempo minora e ajeita, recobre a pele arrancada, mata o viço do brilho de outrora, mas a vida fica, sempre e cada vez mais, e se acumula e nos torna exatamente aquilo que fizemos e faremos dela. Exatamente. Portanto, meu amor, tenhamos coragem. Façamos com a vida o que queremos que ela faça de nós.

Desejo um 2007 do jeito que a gente quiser.

Ticcia


Mais uma vez ela vem me deixar de boca aberta, de coração na mão e com os olhos cheios d'água, sentindo-me exposta e desnudada diante de todos...
E desejando mais avidamente do que nunca um novo texto, um novo ano, um novo recomeçar...
Porque poucas pessoas tem a capacidade e o dom de nos deixar assim, e ela o tem maravilhosamente...

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Do saber... Mas não querer...

"As coisas não se despedem de mim, ou eu as impediria de irem embora. Se as coisas se vão, é porque se evadem mansas e silentes, sem que eu as perceba. Gastam-se, aniquilam-se e desaparecem, escapam pelas frestas dos dedos e viram essa estranha poeira que vaga pela vida, transformando as cores, misturando-se à neblina dos dias, reconfigurando as margens. É quando o que existe dentro vira mundo novamente."

escrito por Ticcia

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Da série 'favoritos'...

Eu te amo


Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.




Tom Jobim/Chico Buarque

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Da memória...

A persistência da memória (1931)
Salvador Dalí

Daqui: Dali


"A diferença entre as lembranças falsas e verdadeiras é a mesma das jóias: as falsas sempre aparentam ser as mais reais, as mais brilhantes." Salvador Dalí

Precisa dizer mais alguma coisa?

terça-feira, dezembro 12, 2006

Da série 'novos favoritos'...

Porque novos amigos também são feitos à distância, têm muitas coisas em comum...
E porque tem muito de mim nos textos dela...

Aqui: O Fantasma

E aqui: Simbolismos e caixas de DVD

... entre outros...

"Porque a distância física não é tão grande assim para tornar as conversas mais formais e aumentar a distância dos nossos pensamentos, sentimentos e dos nossos desejos para quem a gente quer bem de plenitude do corpo e da alma."

domingo, dezembro 10, 2006

Muito de mim...

"E escrevi o teu nome e o teu número de telefone numa página da agenda do mês de Fevereiro. E, ao escrevê-lo, sabia que era uma despedida, mas todo o mês de Março nos arrastámos na despedida, como caranguejos na maré vazia. Sem ti, lancei outras raízes, construí pátios e terraços, fontes cujo som deveria apagar todos os silêncios, plantei um pomar com cheiro a damasco, mandei fazer um banco de cal à roda de uma árvore para olhar as estrelas do céu, um caminho no meio do olival por onde o luar pousaria à noite, abóbodas de tijolo imaginadas pelo mais sábio dos arquitectos e até teias de aranha suspensas no tecto, como se vigiassem a passagem do tempo. Nada disso tu viste, nada te contei, nada é teu. Sozinhos, eu e a aranha pendurada na sua teia, comtemplámo-nos longamente, como quem se descobre, como quem se recolhe, como quem se esconde. Foi assim que vi desfilar os anos, as paredes escurecendo, um pó de tijolo pousando entre as páginas dos mesmos livros que fui lendo, repetidamente. Heathcliff e Catarina Linton destroçados outra vez pela minúcia do tempo.
Como explicar-te como tudo isto se te tornou alheio, como tudo te pareceria agora estranho, como nada do que foi teu vigia o teu hipotético regresso? Ulisses não voltará a Ítaca e Penélope alguma desfará de noite a teia que te teceste.

E arranquei a página da agenda com o teu nome e o teu número de telefone. Veio a seguir Abril e depois o Verão. Vi nascer a flor da tremocilha e das buganvílias adormecidas, vi rebentar o azul dos jacarandás em Junho, vi noites de lua cheia em que todos os animais nocturnos se chamavam rãs, corujas e grilos, e um espesso calor sobre a devassidão da cidade. E já nada disto, juro, era teu.

E foi assim que descobri que todas as coisas continuam para sempre, como um rio que corre ininterruptamente para o mar, por mais que façam para o deter.

Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogámos o seu sentido. Nisto eu acredito: na veemência destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos.

E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas ilusões de que tudo podia ser meu pra sempre."

Miguel Sousa Tavares


Trecho do livro Não te Deixarei Morrer, David Crockett


Mas o amor à primeira vista foi aqui: Cafeína

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Do desejo...

"Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão está ai, haverá sol quase todos os dias, e sempre resta essa coisa chamada "impulso vital". Pois esse impulso às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo, te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer e, de repente, no meio de uma frase ou de um movimento te supreenderás pensando algo como "estou contente outra vez". Ou simplesmente "continuo", porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicídio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituímos expressões fatais como "não resistirei" por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência."


Caio F.


Encontrado aqui: Cafeína

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Da série 'escrita alternativa'...

Verdades... Mentiras... Certo... Errado... Conceito... Preconceito... Certezas... Dúvidas... Possibilidades... Desejos... Vontades... Inspiração... Respiração... Sim... Não... Talvez... Porque... Perguntas... Óbvias... Latejante... Estimulante... Redoma... Espelho... Reflexo... Cega... Fé... Lucidez... Ensaio... Ator... Escritor... Sensação... Liberdade...
Quais verdades são estabelecidas diante do espelho ao observar o reflexo de si?
Quantas mentiras são mantidas diante das dúvidas a latejar com a respiração descompassada ao ritmo das batidas de um coração preso a uma redoma de vidro?
O que é certo diante da cegueira óbvia das vontades humanas?
O que é errado diante das possibilidades advindas das certezas que a sensação de liberdade dá?
Talvez todas as perguntas que surgem prenunciem a inspiração que foge aos conceitos e preconceitos que o mundo impõe, calcadas nos desejos ensaiados com a ausência da lucidez e que permitem a escrita e a atuação em mais um ciclo de nossas vidas...
Mas seríamos tão senhores de nós para ditar nossa existência? Um sim ou um não nesse instante responderia essa questão mas definiria o que está acontecendo e o que vem depois?
Porque a crença em algo é o estímulo suficiente para continuarmos... Ou não...

terça-feira, dezembro 05, 2006

Subvertendo...

Sob a sombra suave da luz refletida pela face alva da lua cheia dominante em um céu negro as estrelas empalidecem e perdem seu brilho oscilante diante de um par de olhos distantes mergulhados em seu próprio mundo invertido...
Um par de olhos suaves refletidos pelo brilho oscilante da face alva de seu próprio mundo invertido empalidecem o céu perdido entre a luz dominante das sombras das estrelas e a lua cheia negra...
Estrelas invertidas em um par de olhos dominante suaviza o mergulho da lua cheia na sombra distante de seu próprio mundo refletido pelo brilho negro pálido do céu oscilante...

sábado, dezembro 02, 2006

30 de novembro de 2006

Apesar de concordar com o texto sobre saudades de que dói a ausência, o não saber, descobri hoje, ou melhor, aceitei definitivamente, que dói mais em mim a saudade do que poderia ter sido... Saudade sim, porque quando é feita uma escolha surge um mundo de 'ses' que seguem uma existência paralela a que passamos a viver. Se tivéssemos dito um sim ao invés daquele não fruto da dúvida da estabilidade daquela relação, da continuidade daquela situação...
Sim, eu sei que não se vive enquanto continuamos presos ao passado, que não se pode pensar e se prender as possibilidades perdidas pois elas não existem mais, mas como se livrar de um mau hábito, de um vício?
Dos piores hábitos que eu poderia manter, gostar de você é o que mais me consome. Pela minha insistente incapacidade de te abandonar no meu passado, pela minha mania de te procurar inconscientemente e o pior de tudo, conscientemente. Pela minha decisão nunca definitiva de desistir de nós dois, por nunca conseguir seguir vivendo sem olhar para trás. E mesmo escutando meus pensamentos digerindo suas palavras e gritando a plenos pulmões "Não me tomes como um hábito!" continuo nessa espiral de vícios, pragmatismo, desconfiança, descrença, racionalidade, explicações, controle, eu...
Sim, o problema sou eu, com todos meus erros e minha estupidez lógica na crença de que posso controlar meus sentimentos... E sim, eu sei que não conseguirei manter nada na minha vida enquanto não for capaz de abandonar meus velhos hábitos, e isso inclui você.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Tic tac

A impressão atual é de que os minutos se arrastam indo contra a correnteza dos segundos que transbordam da fonte do tempo. Contra-senso? O tic tac inexistente dos relógios modernos me assombram, a noção da temporalidade assume nova forma com o passar dos anos cada vez mais rápido. Mas como se as horas se estendem pesadamente?
Talvez o que realmente é assustador seja o tic tac dentro da minha cabeça que assume o som do tempo exterior, convenção tacanha de uma dimensão intocável: o tempo. Confundem-se as diversas impressões e encontro-me no meio, mergulhada no torpor dos dogmas mundanos, adormecendo lentamente ao som do pêndulo que se move para lá e para cá... As vidas são embaladas por esses sons e talvez a liberdade seja reconhecida com a independência a tirania do escorrer da areia, da sombra formada com o mover do sol, do soar dos sinos, das horas... Hora de acordar, comer, trabalhar, estudar, conversar, descansar, sonhar, dormir... Horas... Quantas horas somos capazes de criar ao som do tic tac ao fundo impulsionando-nos a cada vez mais horas, hipnoticamente esquecendo de manter a única hora necessária para nós, a hora magna – a hora de viver – estabelecida em um ínfimo momento independente a consciência da nossa existência, ao tempo, ao espaço, a tudo criado por nós...
Durante um breve intervalo a impressão atual é de que os minutos voltaram ao seu fluxo normal...
Mas o que é o tempo?
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